A aventura da sobrevivência do espaço periférico num mundo que o ignora e/ou o sevicia, por Márcio Rufino Silva, Amélia Luisa Damiani e Ricardo Baitz

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Deslocando-se para um “intermédio” localizado entre ambos centros metropolitanos (São Paulo e Rio de Janeiro), chegamos à borda metropolitana oeste carioca, mais especificamente no município de Seropédica, a cerca de 75 quilômetros do centro da cidade do Rio de Janeiro. Neste município, onde vivem cerca de 82.000 habitantes, localiza-se o campus principal da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), bem como uma unidade descentralizada da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, localmente denominada “Embrapa Agrobiologia”.

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Além das duas importantes instituições públicas citadas acima, e mais a existência da Floresta Nacional Mário Xavier (administrada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, o ICM-Bio), destacam-se a recente inserção do território do município em uma trama logístico-empresarial, pautada por médios e grandes empreendimentos industriais e “estruturas produtivas condominiadas”, bem como “adequações contemporâneas entre o desenvolvimento-modernização-crescimento econômico e uma suposta sustentabilidade ambiental de escopo atemporal” (OLIVEIRA, 2016, p. 88). Leandro Dias de Oliveira, professor do Departamento de Geociências da UFRRJ, assevera a convivência contraditória entre uma política local de desenvolvimento econômico pautada no incremento da produção industrial (uma “reabilitação ideológica da fábrica em esconderijos espaciais da metrópole”, lida pelos organismos oficiais do município como uma “revolução industrial extemporânea”), um slogan político-eleitoral pautado na “sustentabilidade” (sobretudo na gestão 2013-2016, compreendendo, inclusive, a exportação do “modelo” e “exemplo” de “planejamento urbano” a outros municípios!) e uma realidade cotidiana duramente marcada pelas precariedades infraestruturais (saneamento básico, energia elétrica, mobilidade urbana, déficit no atendimento à saúde, à educação e outras áreas) e de segurança pública (extensão incrementada do domínio de grupos milicianos e narcotraficantes). Dessa convivência contraditória, floresce uma esquizofrenia identitária no tocante a esse território: a pobreza e a miséria de colorações nitidamente metropolitanas, uma precariedade na vida cotidiana de feição claramente periférica (as ausências e/ou presenças “perversas” de investimentos do Estado) e traços de uma ruralidade resiliente, em vias de desaparição e/ou convivência subordinada a uma lógica metropolitana, e tudo isso aliado a esses grandes investimentos empresariais pautados na confluência logística de grandes vias de escoamento da produção. Uma verdadeira “visão pelo retrovisor” dos grandes caminhões que atravessam e congestionam a BR-465, no “centro” de Seropédica, “sem criação de quaisquer laços locais”, processo esse que “desarraiga a cidade de seus habitantes e suaviza as densidades socioculturais locais” (OLIVEIRA, 2016, p. 92). Seropédica e a Região Metropolitana do Rio de Janeiro parecem sintetizar uma mal-compreendida hipermodernidade, tão confundida com essa mal-explicada “pós-modernidade”: trata-se de uma realidade regional criticamente marcada pela alimentação constante e permanente da barbárie como a própria subsistência de um ambiente de negócios. Dito de outro modo, a miséria e a violência extrema estetizam-se e mercantilizam-se como imagem. E o descolamento entre o real e o representado há muito tempo já vem sendo criticamente levantado na literatura moderna, principalmente pela tradição marxiana…

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